2.2.5.4 Especificidade, Singularidade e Pessoalidade
Enquanto designers organizacionais nós acabamos por virar caçadores de tensões. Uma boa parte do nosso trabalho envolve ajudar as pessoas a expressarem o que elas gostariam que fosse diferente de forma singular, específica e pessoal.
Específico vs Generalizado
Narrativas genéricas e vagas têm pouco valor para entender tensões organizacionais subjacentes. É preciso ajudar as pessoas a expressarem os problemas de forma específica e concreta.
Um exemplo genérico seria "as coisas poderiam ser melhores". Já um relato específico seria "os prazos de entrega para o cliente X são sempre estourado devido a gargalos na integração entre as equipes A e B".
Quando as tensões são descritas especificamente, temos a abstração reduzida e podemos propor invervenções apropriadas.
Pessoal vs Impessoal
Além de específicas, as narrativas sobre tensões organizacionais precisam ser pessoais, ou seja, conectadas às experiências e sentimentos das pessoas.
Ao invés de "a moral está baixa na empresa", é melhor "Eu tenho me sentido desmotivado ultimamente devido à falta de clareza sobre planos de carreira".
Esse nível pessoal revela como cada um se relaciona com as tensões percebidas. Isso possibilita intervenções que dialoguem com diferentes perspectivas individuais.
Singular vs Misturado
Frequentemente, narrativas sobre tensões contêm múltiplos problemas entrelaçados. É importante ajudar a destrinchar essas questões compostas em tensões singulares e bem definidas.
Por exemplo, a narrativa "Estou insatisfeito com a falta de feedback, oportunidades de promoção e equilíbrio entre vida pessoal e profissional" contém três tensões distintas que devem ser separadas e tratadas individualmente.
Expressar tensões como unidades singulares e bem delimitadas é essencial para análise sistêmica e para se conectar aos anseios genuínos das pessoas.
Anedota Didática
Vamos analisar a seguinte narrativa:
“Tem gente que não sabe se quer ficar num lugar onde ninguém sabe pra onde o barco vai.”
Esta sentença é claramente genérica. Para torná-la mais específica, poderíamos convidar a pessoa a tentar expressar com mais detalhes o problema que ela quer comunicar. Depois de algumas tentativas poderíamos chegar em algo como:
“As pessoas estão perdidas. Não conhecem a estratégia, não sabem se devem priorizar um produto que dê dinheiro ou aumentar a base no curto prazo”
Bem melhor, certo? Mas ainda está muito pouco pessoal.
Ao questionar como a pessoa se relaciona com este fenômeno que ela observa, poderíamos chegar em algo assim:
“Eu sinto angústia quando vejo meu time perdido e sem saber o que priorizar em seu trabalho por desconhecer os objetivos do negócio”
Agora conseguimos chegar num nível de abstração mais baixo e entender como a pessoa se relaciona com isso. Mas parece que existem múltiplas tensões nessa fala.
Após uma boa conversa, podemos identificar três tensões diferentes que a pessoa gostaria de expressar. Aqui estão:
(1) Eu sinto angústia com a falta de visibilidade sobre a estratégia.
(2) Algumas pessoas do time gostariam de um direcionamento mais claro sobre o que priorizar.
(3) Gostaria de evitar que boas pessoas fossem embora devido às incertezas e indefinições da empresa.
Agora temos uma “visão panorâmica” das tensões que a pessoa queria expressar. Compare com a narrativa inicial e veja como o resultado final apresenta muito mais informações úteis para tentar propor algum tipo de intervenção.