2.2.6 Forças Narrativas Organizacionais

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O “Tripé da Tensão” é um conjunto de três narrativas que provê uma estrutura inicial útil para investigar as forças que sustentam qualquer tensão organizacional específica. O tripé ajuda a reduzir a ingenuidade da pessoa agente de mudança, provocando uma reflexão sobre três elementos:

Ganhos Ocultos

Quais benefícios não tão óbvios algumas pessoas ou grupos podem estar obtendo com a perpetuação da tensão? Isso ajuda a explicar por que certos padrões persistem.

Rotas de Fuga

Quais narrativas sugerem que resolução da tensão não é necessária ou viável no momento? Isso revela descrença na possibilidade de transformação.

Contrapontos

Quais perspectivas alternativas negam a própria existência da tensão? Isso indica visões de mundo distintas em jogo.

Repare que no Tripé pressupomos que existem contrapontos, ou seja, assumimos que existem múltiplas perspectivas sobre o contexto e talvez algumas delas até neguem a existência da tensão que estamos investigando.

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Ao mapear ganhos ocultos, rotas de fuga e contrapontos associados a uma tensão, agentes de mudança desenvolvem um mapa mais realista dos interesses em disputa que sustentam o status quo. Isso possibilita projetar intervenções que dialoguem com essas forças, em vez de ignorá-las ou entrar em confronto direto.

As forças narrativas são elementos profundos da cultura informal que exercem influência significativa sobre uma organização. Além do tipé, incluem também os 2.3 Artefatos Culturais , acontecimentos e os pressupostos e crenças arraigadas não questionadas.

Essas narrativas, embutidas na cultura da organização, moldam perspectivas, sustentam o status quo e podem perpetuar tensões organizacionais de forma sutil porém poderosa. Identificá-las e mapeá-las é essencial para uma análise que permita intervenções transformadoras.

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Entenda abaixo como os artefatos culturais, os eventos e acontecimentos e pressupostos podem contribuir para esta análise crítica.

2.3 Artefatos Culturais

Pergunte-se

Que estruturas, rituais, acordos, processos, símbolos estão relacionados a isso que está sendo observado?

Os artefatos representam a camada mais visível da cultura organizacional. Muitas vezes, esses artefatos contêm e reforçam as tensões existentes de maneira sutil. Por exemplo, a linguagem utilizada pode externalizar pressupostos tácitos que perpetuam um problema. Ou a disposição do escritório pode dificultar colaboração entre times.

Mapear os artefatos relevantes a uma tensão específica revela como a cultura informal a mantém no lugar. Isso permite formular intervenções culturalmente sensíveis para catalisar a mudança.

Acontecimentos

Pergunte-se

Que eventos, comportamentos e resultados estão sendo observados? Quais deles parecem se repetir?

As organizações são também moldadas por sua história. Determinados eventos e acontecimentos marcantes no passado legaram lições, crenças e forma de agir que ainda reverberam no presente.

Exemplos incluem crises, escândalos, sucessos extraordinários, aquisições, downsizing, etc.

Esses “marcos históricos” cristalizam certas perspectivas e podem sustentar tensões atuais.

Mapeá-los em relação a uma tensão específica proporciona insights sobre como o passado ainda influencia o presente. Isso possibilita projetar soluções com sensibilidade histórica.

2.4.3 Pressupostos

Pergunte-se

Que valores, crenças e pressupostos podem ser inferidos nisso que está
sendo observado?

Por fim, as tensões frequentemente são enraizadas em pressupostos e crenças profundas não questionadas, que moldam a visão de mundo subjacente.

São tão arraigados no tecido da organização que são tomados como verdades proféticas. Porém, na verdade dão forma a comportamentos, estruturas e processos de modo sutil porém poderoso.

Exemplos: “Clientes não aceitam preços mais altos”, “Inovação vem apenas da alta liderança”, “Colaboração entre áreas não é viável aqui”.

Identificar e questionar esses pressupostos ocultos é chave para desbloquear mudanças autênticas. Como dissecar e transformar crenças e suposições limitantes é um processo não trivial e sempre será enviesado pela perspectiva do observador.

Em resumo, incorporar uma investigação das forças narrativas – artefatos, eventos passados e pressupostos – amplia significativamente a compreensão do sistema e possibilita intervenções transformadoras antes ocultas.

Mapeando as Forças Narrativas

Com as forças narrativas mapeadas, a pessoa agente de mudança possui uma noção muito mais rica das forças multifacetadas que sustentam qualquer tensão organizacional.

Porém, a investigação não para por aí. É preciso também olhar para as inter-relações entre essas variáveis. As forças não operam de forma isolada, mas se reforçam e influenciam mutuamente.

Algumas perguntas-chave ao mapear as forças que sustentam uma tensão:

Esse mapeamento exige uma postura de curiosidade genuína. Não se trata de buscar culpados, mas sim entendimento profundo.

Quanto mais completa a imagem, mais opções se abrem para intervir e dissolver as tensões.

Usando as Forças no Desenho de Experimentos

Ao entender em profundidade as narrativas, pressupostos e interesses que sustentam o status quo, torna-se possível projetar experimentos que dialoguem com essas forças em vez de entrar em confronto direto. Por exemplo, se uma "rota de fuga" comum é a crença de que "nosso negócio é muito peculiar para novas abordagens", o experimento poderia introduzir inicialmente apenas pequenas mudanças altamente adaptáveis, calibradas ao contexto singular da organização.

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O hexagon mapping é uma técnica valiosa para mapear visualmente como um experimento proposto se relaciona com as diversas forças narrativas que sustentam uma tensão organizacional.

Cria-se uma estrutura com hexágonos, cada um representando uma força narrativa relevante - como artefatos culturais, pressupostos arraigados, rotas de fuga, ganhos ocultos etc. No centro, um hexágono representa o experimento.

Utilizando post-its, conexões são traçadas entre o experimento central e cada força narrativa, evidenciando como o experimento dialoga, alavanca ou contorna essa força.

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Com essa abordagem de mapeamento com hexágonos é fácil visualizar a relação entre as forças que sustentam a tensão e os experimentos propostos para resolvê-la.

Isso é útil para que a pessoa agente de mudança tenha mais chances de sucesso ao vender o experimento dentro da organização.

Com o mapeamento integral das forças que sustentam uma tensão, o caminho a seguir fica mais claro. É possível discernir os pontos de intervenção e alavancagem mais efetivos para ajudar a tensão a se resolver naturalmente.

Alguns próximos passos típicos incluem:

O foco deve estar em trabalhar com, e não contra, as forças estruturais identificadas durante o mapeamento. Isso evita reações defensivas e gera mudanças mais sustentáveis.

Nem sempre é possível ou desejável eliminar uma tensão completamente. Às vezes, o ideal é apenas diminuí-la a níveis “produtivos” ou redirecionar suas energias de forma mais positiva. Tensões criativas, afinal, são inerentes a qualquer sistema vivo e adaptativo.

Independente da abordagem específica, o mapeamento integral das forças fornece uma bússola poderosa para navegar o terreno. Permite avaliar as condições para que novos comportamentos, relações e narrativas possam emergir naturalmente a partir do próprio sistema.